Vamos falar de enurese noturna e de chichi na cama. São a mesma coisa?

Em primeiro lugar vamos distinguir a enurese noturna de um chichi na cama. A enurese é diagnosticada quando se verifica uma perda involuntária de urina em crianças a partir dos 5 anos com frequência de pelo menos 2 vezes por semana durante, pelo menos, 3 meses consecutivos. Portanto, se não existem estes critérios não falamos de enurese noturna. Por exemplo, se uma criança de 4 anos que deixou a fralda da noite faz chichi na cama ocasionalmente isso é só normal. É apenas a parte chata para os pais do processo de controlo dos esfíncteres.

As estatísticas mostram que a enurese tem uma incidência entre 6,1% e 15,6% das crianças entre os 6 e os 11 anos (idade escolar). Cerca de 15% dos casos apresentam resolução espontânea, ou seja, não requer tratamento nem intervenção.

Não se conhecem exatamente as causas para a enurese. Parecem estar relacionadas com a predisposição genética, conjugação de fatores sociais, psicológicos e anatómicos. O diagnóstico da enurese deve passar pela avaliação do médico assistente já que é importante o despiste de situações clínicas como anomalias no sistema urinário ou alterações neurológicas. Da mesma forma, as abordagens de tratamento devem ser discutidas em consulta. Geralmente, não se tratam crianças com menos de 7 anos, pelo menos, não com abordagens medicamentosas.

No entanto, abordar a questão é fundamental porque a enurese poderá ter impacto muito negativo na autoconfiança da criança. Neste sentido, é fundamental nunca culpabilizar a criança nem fazê-la sentir-se mal. Lembre-se que é algo involuntário e que a criança não tem capacidade de controlar. Culpar ou ridicularizar a criança só vai agravar o problema, aumentando os seus níveis de ansiedade.

Como referi acima, não é totalmente consensual que as causas emocionais estejam na origem da enurese. Contudo, parece que a ansiedade e o ambiente familiar disfuncional podem agravar o problema.

Evitar a ingestão de líquidos, a partir das 18h, poderá ajudar, mas esta medida deve ser bem avaliada já que pode levar à ingestão insuficiente de água. Os refrigerantes ricos em açúcar e a cafeína também aumentam o número de episódios.

Uma questão frequente é se devemos ou não acordar as crianças para levá-las à casa de banho. Bem, do ponto de vista do sono isto não é uma boa prática. Além disso, como a enurese é involuntária, isso não garante que a criança deixe de fazer chichi na cama.

Se não se trata de enurese mas sim de um processo normal e fisiológico de controlo de esfíncteres também não recomendo que se acordem as crianças para ir à casa de banho nem que as leve à casa de banho “a dormir”. O sono não deve ser interrompido, isso não é um comportamento saudável para o sono. Em primeiro lugar, é necessário ter paciência durante este processo. Em segundo lugar, se o chichi na cama acontece com frequência deve ponderar se a criança estará de facto pronta para o desfralde noturno.

Quando é que vai passar?
Como foi referido acima, a enurese apresenta um caráter genético, ou seja, a idade na qual um dos progenitores deixou de ter episódios, é prognóstica para a idade em que a enurese irá passar no seu filho. Dando um exemplo, se o pai ou a mãe da criança fizeram chichi na cama até aos 9 anos, é provável que essa seja a idade de resolução do seu filho.

Em resumo, enurese noturna e fazer chichi na cama ocasionalmente e/ou após o processo de desfralde não são a mesma coisa. A enurese deve ser diagnosticada pelo médico assistente e as abordagens terapêuticas, que podem passar por medidas de reeducação e sistemas de alarme ou abordagens medicamentosas, devem também ser conversadas com o médico.

Andreia Neves
Cardiopneumologista especialista em Sono Pediátrico