Prometido é devido. Em junho de 2022 a Academia Americana de Pediatria publicou novas orientações para a prevenção de mortes em bebés relacionadas com o sono.

Antes de falar nas novas recomendações, é muito importante que alguns conceitos estejam claros.

O primeiro, é que este documento não é uma opinião de especialistas, este documento é uma guideline internacional baseado na revisão de milhares e milhares de estudos científicos por um painel de especialistas.

Segundo ponto importante é distinguir síndrome de morte súbita do lactente de morte por asfixia. A síndrome de morte súbita do lactente é, como o próprio nome indica, uma morte súbita que, de uma forma simples, como se o tronco cerebral (área do nosso cérebro que controla a respiração) se “esquecesse” de enviar o estímulo para respirar. Não são conhecidas causas, são conhecidos alguns fatores que parecem aumentar o risco. A morte por asfixia acontece quando existe asfixia, por exemplo, por um objeto.

Nas estatísticas mais recentes, a cada ano, nos Estados Unidos, morrem cerca de 3500 bebés entre síndromes de morte súbita do lactente e asfixia. Podemos pensar que 3500 crianças no universo dos EUA não é um número relevante, certo? Mas porque será que este número é tão pequeno? Precisamente porque desde 1990 se têm intensificado as campanhas de prevenção bem como a investigação e divulgação de medidas de prevenção. Neste sentido, é fundamental continuar com a divulgação e intensificação das campanhas de sensibilização para a prevenção de morte associada ao sono.

As orientações de 2022 trazem algumas alterações relevantes comparativamente com 2016 (últimas orientações). Veja quais nas imagens.

  1. Superfície do sono
    1. Em 2016 era apenas recomendada uma superfície firme.
    2. Nas orientações de 2019 é recomendada uma superfície firme, plana e não inclinada.
  2. Amamentação
    1. Já nas orientações de 2016, amamentar parecia estar associado a uma redução do risco de morte súbita do lactente.
    2. Nas orientações de 2022 a evidência continua a apoiar este fator protetor.
  3. Local onde dorme
    1. Em 2016 as orientações recomendavam a partilha de quarto com os pais, num local próximo à cama dos pais mas, preferencialmente, numa superfície distinta da cama dos pais. A partilha de cama parecia aumentar o risco, principalmente em bebés com menos de 4 meses e/ou baixo peso e em situações de partilha de cama insegura (tipo de colchão, posição do bebé, práticas dos pais).
    2. As novas recomendações mantêm forte recomendação com evidência científica muito forte de que os bebés devem dormir junto dos pais, idealmente numa superfície independente, pelo menos, até aos 6 meses. A Academia Americana de Pediatria reitera que respeita as opções familiares na partilha de cama, entendendo que existem várias razões para a opção dos pais. No entanto, em termos de evidência o que temos nesta nova revisão é evidência que é mais seguro que a criança durma numa superfície independente, o mais próxima possível dos pais, mas não comum. É fundamental explicar que a magnitude no risco da partilha de cama não é igual para todos, ou seja, determinadas situações ou condições tornam a partilha de cama mais ou menos segura.
      1. Situações em que a partilha de cama é totalmente contraindicada:
        1. Utilização de medicamentos que induzam sonolência;
        2. Pai e/ou mãe fumadores ou ex-fumadores há menos de 1 ano;
        3. Colchão pouco adequado, por exemplo, demasiado mole ou velho, sofás ou poltronas.
        4. Criança com menos de 4 meses (mesmo sem outros fatores de risco);
        5. Partilha de cama com outro cuidador que não sejam a mãe e o pai do bebé;
        6. Bebé prematuro ou baixo peso à nascença
        7. Utilização de acessórios no berço (fraldas, naninhas, mantas, brinquedos, etc)
  4. Roupa de cama
    1. Este ponto mantém a recomendação de não utilizar roupa de cama, regulando a temperatura do bebé com roupa que veste. Pede-se particular atenção ao sobreaquecimento que é um fator de risco para síndrome de morte súbita.
  5. Utilização de chupeta
    1. Em 2016 recomendava-se a não introdução de chupeta, pelo menos até estabelecimento da amamentação, em bebés amamentados.
    2. As novas orientações mantêm a mesma recomendação. Em bebés não amamentados a utilização de chupeta parece estar associada a redução do risco.
  6. Monitores cardiorrespiratórios
    1. Não está recomendada a utilização destes dispositivos de monitorização cardiorrespiratória para prevenção de morte infantil.
  7. Tummy Time (colocar o bebé de barriga para baixo quando está acordado)
    1. As orientações de 2016 não referiram evidência na associação entre o tummy time e a redução de risco de morte infantil.
    2. As orientações de 2019 encorajam os pais a colocar os bebés na posição de Tummy Time supervisionados e por curtos períodos a iniciar após a alta hospitalar e ir aumentado gradualmente o tempo para 15 a 30 minutos no total.
  8. Swadding
    1. Nas orientações de 2016, a técnica de contenção e enfaixamento era apenas desaconselhada a partir do momento em que a criança começasse a rebolar.
    2. Nas novas orientações o swaddle parece ser desaconselhado.

Não menos importante, as guidelines de 2022 reforçam a necessidade de formação por parte dos profissionais que trabalham com pais e cuidadores bem como informação dos pais para que tomem decisões conscientes. Só desta forma será possível mantermos tão baixo o número de mortes infantis associadas ao sono.

Andreia Neves
Cardiopneumologista especialista em Sono